Crítica de Barbara Heliodora sobre “A Ilusão Cômica”

No dia 10/04/2012, Barbara Heliodora fez uma crítica maravilhosa no Jornal O Globo sobre o espetáculo A Ilusão Cômica:

‘Apenas’ bom teatro

Há algum tempo que São Paulo não nos mandava um espetáculo tão encantador e de tanta qualidade quanto “A ilusão cômica”, que Pierre Corneille escreveu em 1636, portanto no mesmo feliz ano de “Le Cid”, adaptação da lenda do lendário herói espanhol. A peça fala de um pai cuja rigidez afastou o filho, e que agora o busca. Corneille usa isso como moldura de uma estrutura em que arma uma espécie de comédia dentro da comédia, quando o mágico Alcandro faz o pai ter duas visões sobre a vida do filho.

A trama é hábil e divertida, e a tradução/adaptação de Valderez Cardoso Gomes pode reclamar para si o mérito de ter criado um texto ágil e espirituoso, em versos, que permite no espetáculo a busca de um nível daquela artificialidade realista que se chama estilo; os personagens das visões podem ser configurações de certos tipos e comportamentos, mas em todos eles podemos reconhecer virtudes e vícios humanos e até mesmo comuns. E não pode ser mais divertida ou encantadora a apologia do teatro com que Corneille conclui sua deliciosa comédia.

A Cia. Razões Inversas, que apresenta no Teatro III do CCBB esse espetáculo comemorativo de seus 21 anos, faz uma encenação simples, isto é, faz “apenas” bom teatro, com bons atores interpretando um bom texto. O cenário de André Cortez é composto por uma cortina, um piso quadrado e algumas cadeiras, tudo muito bem iluminado por Marcio Aurélio. Os figurinos, dessa mesma dupla, são bonitos e satisfatórios, optando pelo teatral em lugar da época. É ótima a contribuição da máscara de Matamouros, divertido herdeiro do Miles Gloriosus de Plauto, gabola e covarde. Muito bem achada é a trilha sonora de Daniel Maia. Tudo isso é reunido por uma brilhante direção de Marcio Aurélio, que sabe aproveitar o humor e a teatralidade do texto de Corneille, sem obediência servil ou originalidade gratuita para criar um espetáculo alegre, harmonioso, que diverte e tem o que dizer.

Intimidade como vantagem

O elenco tem a vantagem da intimidade, do hábito de trabalhar em conjunto; o resultado é de um alto rendimento de cada ator dentro dos limites de seu papel, dando a devida colaboração para o todo. Clovis Gonçalves e Gonzaga Pedrosa compõem a “moldura” da ação, na qual só Paulo Marcello, no filho Clindor, e Maria Stella Tobar, como Isabel, têm um só papel. André Tristão e Douglas Rosa são eficientes figurantes, enquanto Lavinia Pannunzio e Julio Machado (além de Pedrosa) dobram papéis com grande segurança. A Joca Andreazza cabe a mais difícil tarefa, a de dobrar Alcandro e Matamouros, com uma atuação que se destaca em meio a todo um conjunto de boas interpretações.

É muito bem-vinda ao Rio essa visita de Corneille e da Cia. Razões Inversas, que mostram como pode ser prazerosa uma “Ilusão cômica”.

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